O AFASTAMENTO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES DA SUA FAMÍLIA


Nada substitui a proteção de uma mãe
Fonte da Ilustração: Viva Saúde

Compartilho com vocês orientações dada aos conselhos tutelares da região de Cianorte por este que vos fala sobre um assunto MUITO SÉRIO: Retirada da criança de sua família pelos Conselhos Tutelares.  Qual a dor da família e da criança nestas situações? Quais as consequências para a sociedade? Sou completamente contrário ao afastamento por motivos "banais". Trata-se na maioria das vezes DA CRIMINALIZAÇÃO DA FAMÍLIA POBRE PELO ESTADO, subtraindo destas o que elas tem de mais valioso: SUAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES. Ou alguém aí já viu filho de rico ser retirado da família? Segue íntegra da orientação:



Prezadas (os).Reforçamos a razão de existir de vocês: PROTEÇÃO A CRIANÇA E AO ADOLESCENTE. Esta proteção se realizada com qualidade garante transformações intergeracionais na realidade social das nossas cidades. As crianças protegidas de hoje são os adultos que protegerão amanhã, assim como as desprotegidas possivelmente terão dificuldade de tornar adultos que protegem.

O trabalho de vocês é um dos mais difíceis de ser realizado entre todos os serviços públicos. Vocês tem que averiguar e proteger, mas sem investigar (aí é a polícia) ou sem condenar (aí é MP e Judiciário). Vocês tem que resolver um problema aplicando medidas, mas sem executar nada (aí são os serviços públicos). OU SEJA UM PASSO A MAIS OU A MENOS PODE SIGNIFICAR A PROTEÇÃO OU A DESPROTEÇÃO, O CUMPRIMENTO FIEL DE SEUS DEVERES OU O ABUSO DE PODER. Por isso vocês são um colegiado. Por isso vocês tem o poder de requisitar serviço e servidores públicos para ajudá-los neste importante papel de proteger nossas crianças. NÃO FAÇAM NADA SOZINHOS, NÃO QUEIRAM SER  HERÓIS.

Sugiro que vocês leem meu artigo que trata sobre a qualidade do atendimento nos CTS: Parametros para Qualidade no Atendimento dos Conselhos Tutelares

De suma importância é acompanhar o CAOPCAE (tipo uma Vara da Infância na esfera estadual do MP). No site deles vocês vão encontrar perguntas e respostas sobre o CT (link abaixo), modelo de documentos, artigos, jurisprudências e tantos outros. Dr. Murillo José Digiacomo despensa apresentação, puro e simplesmente É O CARA NO BRASIL, QUIÇÁ NO MUNDO, QUANDO O ASSUNTO É DIREITOS DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES. Nada mais e nada menos ele foi um dos redatores do ECA, assim como de todas as reformas do mesmo.

Link para o CAOPCAE:Artigos do Ministério Público do Paraná

Nós da SEDS temos a responsabilidade de orientá-los. Nós do ER Cianorte avançamos para dar o suporte a vocês sobre os assuntos de maior possibilidade de sucesso ou risco para o CT. Trata-se dos fatos atendidos por vocês que mais podem implicar em consequências para as crianças e para vocês. CRIME E AFASTAMENTO DO CONVÍVIO FAMILIAR. São assuntos no qual a participação de vocês É MÍNIMA. Nestes assuntos O TRABALHO EM REDE É A GARANTIA DO SUCESSO. Aconselhamos que toda e qualquer decisão envolvendo estes assuntos sejam tomadas pelo Colegiado (5 membros) depois de uma qualitativa averiguação com a participação de técnicos da rede, preferencialmente da política de Assistência Social. MINISTÉRIO PÚBLICO ENTRA DE IMEDIATO NESTES ASSUNTOS. Muito cuidado quando estiverem na eminência de crimes, principalmente Abuso Sexual, a criança ou adolescente deve ser ouvido uma única vez (Ver acordo entre Judiciário, MP e Polícia do PR), e quem irá determinar a pessoa que irá ouvi-lo é o MP.

ESPECIFICAMENTE SOBRE O AFASTAMENTO DO CONVÍVIO FAMILIAR

Trabalhei no monitoramento e avaliação do Programa Crescer em Família da SECJ. Conheci a realidade dos abrigamentos no Paraná através dos fatos e números. Tínhamos uma banalização da medida de acolhimento: por qualquer motivo se acolhia. Nesta época os CT's eram responsáveis por mais de 90% dos abrigamentos do Paraná. Tanto nós da SECJ, quanto o MP e o Judiciário do Paraná estávamos convencidos que precisávamos tomar uma medida para estancar esta sangria. Em 2009 veio a resposta através da nova lei de adoção: O CT NÃO PODIA MAIS ABRIGAR OU AFASTAR DO CONVÍVIO FAMILIAR (família natural: pai e mãe). Outras medidas que visavam endurecer a banalização também foram contempladas, inclusive a proibição de afastamento por motivo de carência de recursos financeiros ou materiais. Ainda permanecia a possibilidade de afastar por motivo da criança ou adolescente estar na presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes (vide antigo Art. 19 do ECA que abre o Direito a Convivência Familiar e Comunitária). Em 2016 uma lei retificou este artigo, retirando a parte dos entorpecentes. MUITO CUIDADO COM ECA ANTIGO E DESATUALIZADO, ACONTECERAM MUITAS REFORMAS.

MAS O CONSELHO PODE AFASTAR DO CONVÍVIO FAMILIAR, QUANDO E COMO?

SIM, pode, vide páragrafo único do art. 136 do ECA que trata sobre as atribuições dos conselheiros tutelares. No entanto é necessário comunicar INCONTINENTI (significa de imediato) o fato ao MP. NÃO TEM 24 HORAS, É DE IMEDIATO. O referido parágrafo coloca "SE NECESSÁRIO", não é por qualquer motivo. ONDE ESTÁ O MOTIVO NO ECA

Conforme apontado pelo Dr Murillo está no parágrafo segundo do art. 101 que trata das medidas a serem aplicadas, vejam: "Sem prejuízo da tomada de medidas emergenciais para proteção de vítimas de violência ou abuso sexual e das providências que alude o art. 130 desta lei, o afastamento da criança ou adolescente do convívio familiar é de competência exclusiva da autoridade judiciária ...". OU SEJA, SE FOR VIOLÊNCIA E ABUSO SEXUAL NUM CENÁRIO DE EMERGÊNCIA O AFASTAMENTO PODE SER REALIZADO POR OUTRA AUTORIDADE SE NÃO O JUDICIÁRIO. Qual é esta autoridade: CT. SOMENTE SE A CRIANÇA OU ADOLESCENTE ESTIVER EM EMINENTE RISCO DE VIDA É QUE VOCÊS PODEM AFASTÁ-LOS DA FAMÍLIA. E ainda assim comunicar INCONTINENTI o fato ao MP.

Por favor, evitem aplicar medidas de afastamento de convívio familiar. É UMA MEDIDA MUITO SÉRIA.

Vejam abaixo da minha assinatura a íntegra da minha pergunta e da resposta do Dr Murillo sob um fato aí de vocês. EU NÃO CITEI NOMES.

ÍNTEGRA DO EMAIL COM A PERGUNTA AO DR MURILLO

Em 23 de janeiro de 2017 16:12, Jose Divaldo Rufino <rufino@seds.pr.gov.br> escreveu:
Prezado,

Há muito acompanho sua trajetória ímpar em defesa dos direitos das nossas crianças e adolescentes. Trabalhei por 9 anos em Curitiba na SEDS e antiga SECJ. Sempre estive envolvido com o direito a Convivência Familiar e Comunitária, era o responsável em monitorar e avaliar o programa Crescer em Família: acolhimento institucional, família acolhedora e apadrinhamento afetivo. Hoje sou responsável em prestar apoio técnico junto aos Conselhos Tutelares.

PERGUNTA

O Conselho Tutelar pode afastar do convívio com os pais uma adolescente que foi encontrada em uma festa imprópria na madrugada, encaminhando-a para um parente (família extensa) mediante Termo de Responsabilidade? O pai é alcoólatra e responsável pela filha (informalmente). A mãe é separada do pai e prioriza a relação com seu novo cônjuge. O conselho alega ter conversado muitas vezes com os pais. Não foi informado se houve trabalho com a rede de atendimento.

Gostaria de seus comentários sobre os motivos do afastamento e da medida aplicada: o conselho não encaminhou para uma instituição de acolhimento, mas sim para a família extensa (a qual sabemos ter preferência quando o processo é judicial).

ÍNTEGRA DA RESPOSTA DADA POR DR MURILLO


Prezado José Divaldo,
Bom dia!
Conforme consta de várias orientações publicadas na página do CAOPCAE na internet, o Conselho Tutelar não tem atribuição para promover o afastamento de criança/adolescente do convívio familiar, medida extrema, de competência exclusiva da autoridade judiciária, que pressupõe a instauração de procedimento contencioso, no qual se garanta aos pais/responsável o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Vale dizer que isto é válido tanto para sua colocação sob a guarda de pessoa diversa (seja parente ou não da criança/adolescente) quanto para o fim de acolhimento institucional (o acolhimento, neste caso, será uma medida "subsequente" ao afastamento, e o Conselho Tutelar somente pode aplicar a medida de acolhimento quando esta é aplicada de forma "isolada", ou seja, em se tratando de criança/adolescente que, por qualquer razão, já não esteja convivendo com seus pais/responsável, seja por terem estes falecido, estarem em local ignorado ou momentaneamente inacessível).
Importante destacar que o afastamento do convívio familiar não pode ser utilizado como forma de "punição" aos pais/responsável que, eventualmente, tenham violado direitos de seus filhos (até porque estes também serão atingidos - e talvez com uma intensidade muito maior - por tal "punição", violando assim o princípio constitucional insculpido no art. 5º, inciso XLV, de nossa Carta Magna), pois isto, se for o caso, deverá ocorrer na esfera própria, por meio de procedimento judicial próprio (de natureza, criminal e/ou civil), onde mais uma vez deverá ser assegurado o exercício do contraditório e da ampla defesa, sendo absolutamente inadmissível que ocorra de forma sumária/arbitrária na esfera administrativa (e sem que haja, sequer, a instauração de qualquer procedimento administrativo), pelo Conselho Tutelar (ou pior - em muitos casos pelo "Conselheiro de Plantão", sem sequer passar pelo "crivo" do Colegiado do órgão).
O máximo que o Conselho Tutelar poderia fazer, em uma situação verdadeiramente "emergencial" (e temos que ter muita cautela para definir o que, de fato, é "emergencial" a determinar a tomada de uma medida mais drástica que, potencialmente, pode também violar direitos das crianças/adolescentes que serão por ela atingidas, especialmente se tomada de forma precipitada), ocorrida no período noturno é, ouvida a criança/adolescente (e eles, desde que tenham condições de exprimir sua vontade, devem ser SEMPRE ouvidos e exprimir sua opinião acerca do se pretende fazer, seja por força do disposto no art. 100, par. único, incisos I e XII, do ECA, seja do contido no art. 12, da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança), encaminhá-la para um simples PERNOITE na casa de algum parente ou pessoa por ela indicada ou, se isto não for possível, para que tal PERNOITE ocorra em uma entidade de acolhimento, mas em qualquer caso, NO DIA SEGUINTE, o caminho "natural" a seguir (por força dos verdadeiros princípios insculpidos no art. 100, par. único, incisos IX e X, do ECA), será a REINTEGRAÇÃO FAMILIAR, ressalvada a existência de situação que - comprovadamente (e mais uma vez sob o ponto de vista técnico, após a referida oitiva da criança/adolescente) - se mostrar impossível/inviável (caso em que, se for o caso de "formalizar" o afastamento, deverá ser instaurado o procedimento judicial contencioso já referido).

Vale destacar que essa oitiva deve ser realizada, de preferência por meio de uma EQUIPE TÉCNICA ou, ao menos, por meio de algum TÉCNICO a serviço do município (e a "rede de proteção" à criança e ao adolescente local precisa se organizar de modo que tais técnicos estejam à disposição, ainda que em regime de "sobreaviso", para que possam ser acionados pelo Conselho Tutelar a qualquer hora do dia ou da noite, inclusive nos finais de semana e feriados - onde, por sinal, ocorre boa parte das violações).

O ideal é que seja estabelecido um "fluxo" entre o Conselho Tutelar e a "rede", de modo que qualquer iniciativa semelhante pretendida pelo Conselho Tutelar (ou pelo "Conselheiro de Plantão") seja PRECEDIDA de uma avaliação técnica do caso e da mencionada "escuta qualificada" da criança/adolescente, evitando assim o afastamento do convívio familiar de forma indevida (que pode ser particularmente traumática e prejudicial para criança/adolescente que se pretende proteger), sendo certo que esta servirá inclusive para que, se for de fato o caso de afastamento, fornecer subsídios ao Ministério Público (que deverá ser acionado na forma do art. 136, par. único, do ECA) para propositura da medida respectiva.

Em qualquer caso, como costumo dizer, não podemos confundir a necessidade de agir com "rapidez" (ou "prioridade absoluta", como previsto na lei e na CF) diante de uma suposta violação de direitos de crianças/adolescentes, com uma espécie de "carta branca" para que se atue com "precipitação/açodamento", até porque é preciso agir com RESPONSABILIDADE e encontrar a solução que - CONCRETAMENTE - atenda aos interesses das crianças/adolescentes que serão atingidas pela intervenção estatal (razão pela qual sua mencionada "escuta qualificada" é fundamental, até mesmo para que possamos saber o que elas esperam de nós - e/ou que tipo de "proteção" elas gostariam de receber).

Desnecessário dizer que a criança/adolescente destinatária da intervenção estatal não se sentir de fato "protegida" por esta (como quando de um "arrebatamento arbitrário" - e contra sua vontade manifesta - do convívio familiar), corremos o sério risco de causar-lhes um "mal" maior do que vinham (supostamente) suportando até então.
Foi por estas e outras razões que a lei não concedeu ao Conselho Tutelar a atribuição de promover o afastamento de criança/adolescente do convívio familiar, e a forma como isto vem ocorrendo em muitos casos é absolutamente ILEGAL/ARBITRÁRIA, acabando por aumentar (de forma indevida) a demanda sobretudo para o acolhimento institucional e trazendo graves prejuízos às crianças/adolescentes atendidas.

É preciso lembrar, por fim, que tanto o Conselho Tutelar quanto a "rede de proteção" à criança e ao adolescente TAMBÉM têm por DEVER INSTITUCIONAL a proteção à FAMÍLIA (que na forma do art. 226, caput e §8º da Constituição Federal tem direito à "proteção especial" por parte do Estado - lato sensu), e devem SEMPRE trabalhar na perspectiva de manutenção da criança no seio de sua família de origem e da orientação e suporte aos pais/responsáveis, de modo que estes cumpram de maneira efetiva/adequada seus deveres para com seus filhos/pupilos (mais uma vez por força, inclusive, dos princípios relacionados no art. 100, par. único, incisos IX e X, do ECA), não podendo o afastamento do convívio familiar ser visto como "medida de proteção" e, muito menos, "solução" para o caso.

Os "fluxos" e "protocolos" a serem adotados toda vez que situações de maior gravidade e/ou tidas como "emergenciais" ocorrerem devem ser definidos entre os técnicos da "rede de proteção" e o Conselho Tutelar, de modo que sejam definidos papeis, responsabilidades e apresentadas as justificativas técnicas devidas para as ações que se pretende implementar, sem prejuízo da instituição de mecanismos que permitam o acionamento/comunicação rápida entre os diversos órgãos corresponsáveis pelo atendimento, seja para realização do "diagnóstico" da situação, seja para definição do que fazer em cada caso (observadas suas peculiaridades e as mencionadas opiniões - e "expectativas" - daqueles que serão atingidos pelas providências respectivas).
Quão mais "grave" o caso, mais cautelosa/criteriosa deve ser a avaliação técnica, não podendo JAMAIS sua solução ficar unicamente a cargo do Conselho Tutelar (ou pior: do "Conselheiro de Plantão").

Espero ter podido ajudar na reflexão.
Material adicional sobre o tema pode ser encontrado na página do CAOPCAE na internet.
Fique à vontade para repassar este e-mail a outros membros do Escritório Regional e a quem mais você entender pertinente.

Cordialmente,
Murillo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe sua opinião para juntos melhorarmos a qualidade dos serviços públicos